Um livro mau é quando a pessoa esconde a incapacidade de fazer uma história atrás de elucubrações filosofantes. Se um escritor não agarra o leitor pelas tripas logo nas primeiras páginas, está feito ao bife.

É terrível uma pessoa sentir-se o centro do Mundo, mesmo para si própria. Dá um alívio bestial – a gente vê isso nas análises – quando um gajo descobre que deixa de ser o centro do Mundo e que as outras pessoas são iguais a ela, que ela deixa de ser realmente o centro, o sol, a coisa mais importante.

As razões por que se gosta dos livros são muito variáveis. De uns gosta-se deles em si, de outros gosta-se por razões mais afectivas, de outros ainda pela forma como foram recebidos pelas pessoas. Embora de uma forma diferente, acaba-se por gostar de todos, senão não os publicávamos.

Aprende-se a escrever, lendo. E também é necessária uma grande humildade face ao material da escrita. É a mão que escreve. A nossa mão é mais inteligente do que nós. Não é o autor que tem de ser inteligente, é a obra. O autor não escreve tão bem quanto os livros.

Um livro tem de ser suficientemente poroso para o leitor poder escrever o seu próprio livro dentro dele. É nesse sentido que um livro muito compacto é, forçosamente, um livro mau.

A nossa vida de adulto não é mais do que a infância fermentada.

Ninguém sabe o que é a morte, mas não faz muita diferença porque também nunca sabemos o que é a vida.

São precisas muitas mulheres para esquecer uma mulher inteligente.

Muitas vezes as coisas que nos tocam mais são aquelas que na altura em que estão a acontecer nem nos apercebemos.

A inspiração faz-me confusão. Nunca a tive. Acho-a uma desculpa para não fazer nada.

Quem lê é a classe média.

É mais sensual uma mulher vestida do que uma mulher despida. A sensualidade é o intervalo entre a luva e o começo da manga.

Uma coisa é o amor, outra é a relação. Não sei se, quando duas pessoas estão na cama, não estarão, de facto, quatro: as duas que estão mais as duas que um e outro imaginam.

Não quero que me respeitem a mim, quero que respeitem a honestidade do meu trabalho.

Quando uma pessoa acaba por ter tão pouco tempo para estar com os amigos, para escrever as suas histórias, isso acaba por nos fechar, por nos tornar tímidos, introvertidos e por vezes até com dificuldade de relação.

Os livros permitiram-me conhecer pessoas melhores do que nós. Que têm um calibre humano que eu não tenho.

A vida das pessoas move-se por desafios constantes. Aqui há tempos estive a ler uma autobiografia do Graham Greene, em que ele dizia não compreender como é que as pessoas que não escreviam escapavam à melancolia. A escrita é um maravilhoso substituto da depressão.

Os homens nuca dizem: «Já não gosto.» Dizem: «O problema não está em ti, está em mim. Preciso de pensar, preciso de espaço...». As mulheres são muito mais directas: «Deixei de gostar de ti.» E pronto. Os homens nunca o dizem porque querem que a mulher fique de reserva.

Penso, cada vez mais, que um romance tem de contar uma boa história; boa e bem contada. Quanto à Agustina e ao Vergílio Ferreira, estou farto de Faulkners do Minho e de Sartres de Fontanelas, e ainda por cima maus.

Nós somos felizes só por instantes. Temos medo de viver um grande amor. Estamos muito mais habituados a sofrer do que a ser felizes.

No amor podemos substituir uma pessoa por outra, mas não na amizade, porque cada amigo tem o seu lugar e não podemos substitui-lo.

Por que é que havia de me sentir sozinho? Raras vezes na minha vida, desde que me lembro de mim, tive um sentimento de solidão. E não me sinto mal na minha companhia, divertimo-nos muito os dois, eu e eu. Não me aborreço.

Compreendi o valor da amizade, em momentos especiais, quando o Céline me escreveu, quando o Jorge Amado me escreveu, ambos com uma grande estima e uma grande amizade. Isso fez-me pensar que havia pessoas mais generosas e melhores do que eu. Ser amigo é a única forma de se estar com os outros.

Antes da «Memória de Elefante» escrevi muitos livros, tive foi o bom senso de os deixar na gaveta. É um livro de principiante. O primeiro de que não me envergonho é a «Explicação dos Pássaros».

Acho que os escritores percebem muito melhor o que escrevemos que os críticos. Os escritores têm, afinal, a mesma humildade dos leitores comuns. Os críticos raramente entendem o nosso trabalho.

Gosto das pessoas que têm cara de quem vive. E isso não tem a ver com beleza. Normalmente, as pessoas que eu acho atraentes não são bonitas, têm um charme lento, que eu não sei explicar.

Escrevo com dificuldade, sou muito lento, o que parece paradoxal em relação ao número de livros que já publiquei. Mas, se não escrevo, é como se me vestisse sem tomar banho. Um grande desconforto interior.

O livro é um organismo que vive independente e surpreende-nos a cada passo. Um livro não se faz com ideias, faz-se com palavras. São as palavras que se geram umas às outras. E com trabalho.

Há uma parte subterrânea nas obras de arte impossível de explicar. Como no amor. Esse mistério é, talvez seja, a própria essência do acto criador. A gente não sabe...

Quando lês um livro de uma pessoa que conheces, o livro fica diferente. Quando leste vários livros de um escritor que não conheces e depois conhece-lo, sejas ou não amigo dele, o livro fica diferente.

Desde que me lembro, desde os 4 ou 5 anos, o que me interessava era escrever. Às vezes tinha um jantar marcado com uma rapariga e acabava por ficar a escrever. Sentia-me culpado quando não escrevia, muito culpado. Depois, parece que os livros foram aparecendo em contínuo.

Eu penso que aquilo que faz com que nós continuemos vivos e capazes de criar é isso mesmo, uma inquietação constante. Sem ela não pode haver criação, quem não põe, sempre, tudo em causa, arrisca-se a ter uma vida interior de três assoalhadas.

É muito curioso como em todas as coisas há vida. Esta oferece, constantemente, materiais maravilhosos que na maior parte das vezes um escritor não utiliza. Isso acontece porque todos nos esquecemos de olhar. Escrever é não se esquecer de olhar.

Idealmente, a missão da crítica seria ajudar a ler. Em teoria, o crítico será um leitor mais atento do que os outros. Não tem necessariamente que emitir juízos de valor. Temos tendência a gostar só dos que são da nossa família, as ideias confundem-se com as nossas paixões.

O próprio do homem é viver livre numa prisão. Estamos sempre condicionados e até prisioneiros de nós próprios.

A amizade é regida pelo mesmo mecanismo que o amor, é instantânea e absoluta.

Toda a invenção é memória. (...) Quem nos arranja os materiais é a memória. As tais coisas de que a gente não fala e aparecem nos livros, de maneiras desviadas.

O escritor é um neurótico, e escrever é provavelmente a única forma que tem de exprimir os seus afectos, e de neles ser retribuído. É complexo, porque é misturado com uma grande dose de narcisismo.

A escrita é sempre um acto de fuga à depressão. Nunca encontrei ninguém com tanto medo da morte como os médicos.

Não tenho muito jeito para viver. E acho que os livros são a minha redenção.

Percebo muito bem que os emigrantes só pensem em regressar, mesmo que seja para fazer casas de azulejo: há um charme lento neste país que é irresistível.

É impossível alguém escrever para a gaveta; quando se escreve é para se ser lido por alguém, e não nos ser concedida uma oportunidade é muito injusto.

Eu gosto desta terra. Nós somos feios, pequenos, estúpidos, mas eu gosto disto.

É verdade que não pode haver alegria sem tristeza, prazer sem dor. É só quando dói um dente que avaliamos o prazer de nos sentirmos bem, não é? Se a gente não compreende essa antinomia, acaba por haver uma cristalização burocrática das emoções e dos sentimentos.

A luta com as palavras, a luta para fabricar um universo vivo, um livro, é a única chance que temos de ficarmos grávidos. E depois queremos todos ter filhos perfeitos e lindos que nos prolonguem a vida.

A loucura é qualquer coisa que existe em todos nós, é mais um receio que uma realidade. No fundo, o que é enlouquecer? É sair de uma determinada norma, não é? É preciso muita coragem para se ser realmente louco.

O grande artista traz uma forma diferente de colorir.

Eu não sinto prazer em escrever – sinto prazer, sim, na leitura. Mas se não escrever sinto-me pior, não sei, começo a fica impaciente.

Não há honestidades possíveis. Ou há honestidade ou não há.